sexta-feira, 20 de setembro de 2013

A rapariga e a sua janela.

Como já nada lhe importava do que pudesse ou não vir acontecer, sentiu-se condenada a viver fora do tempo. Os dias passavam tornando as suas palavras transparentes como o vidro da janela onde agora se encostava. Era ali que sonhava enquanto espreitava o mundo lá fora. Gostava de encostar quase a boca ao vidro e embacia-lo com a respiração. Só os lábios respiravam. Era o único meio de lhe tapar a visão. Umas vezes com o indicador quente desenhava, era uma forma de acrescentar algo que gostava de poder observar. Outras vezes fantasiava com quem passava, ou com o que encontrava. A verdade é muito mais complexa como gostaria que fosse, pensava ela. E mesmo quando tudo existe nada existe realmente, está tudo tão longe da sua realidade como do seu próprio silêncio. Ali era o seu lugar secreto, era ali que deixava a sua mente vaguear à vontade enquanto acreditava no presente idealizando um futuro livremente. Apreciava a brancura dos aviões que atravessavam o céu deixando para trás um passado em movimento. As cores que ofereciam as flores do jardim em frente combinavam com o dia ardente que estava, tal como vento que se aventurava entre as folhas das árvores estimando e intensificando o poder da natureza. Também dali podia observar as transformações diárias desde a fresca e resplandecente aurora até a mais secreta e triste noite. A lua, essa, tinha sempre uma aparência diferente, embora só a visse de frente. E assim passava o seu tempo, os dias iam e vinham e ali acontecia de tudo. Não sabia viver fora do tempo, não sabia quando chegaria um final. Mas talvez ela não estivesse de facto à procura de nada definitivo.
A rua estava totalmente tranquila. Não passavam carros nem se viam pessoas.
Encostou novamente a boca ao vidro, embaciou-o, desenhou e beijo-o.

domingo, 15 de setembro de 2013

"candeeiros que baloiçam com o vento e laranjas que caem com o tempo."

                                                                       ontem 



O JP Simões é o Eduardo Lourenço da música popular portuguesa. Cada disco seu que se publica é uma manifestação nacional de inteligência, mesmo que a nação possa andar distraída ou ressentida, aborrecida ou esganada (...). Este disco é terapia para o português cinzentismo, para a merklice aguda, para a gula capitalista, para o desperdício da paixão. Desmistificando decadências e confessando vícios e afectos, Roma é um certo folclore pejado de alegrias, contagiante, impossível de ser parado. É o Eduardo Lourenço a fumar a relva e a curtir muito bem curtida uma bela guitarra". v.h.m