as portas do metro abrem-se quando ela entra de mãos dadas com a mãe.
vinha de tranças no cabelo e mochila às costas. devia ter uns seis, sete anos talvez. as calças estavam manchadas de terra de tanto embarrarem no chão, pois chovia nesse dia. para ela nada de preocupante, agora para a mãe sim. delicadamente dobrou-as para que não chegassem a casa em estado pior do que já estavam. sorriram uma para a outra. docemente sentou-se como gente "grande". cruzou as pernas, pousou as mãos sobre elas observando tudo o que se passava à sua volta. aquele olhar atento foi de encontro ao meu. um olhar que não mente nem esconde segredos. tão puro e inocente entre as realidades mais penosas, complicadas, árduas que nos "cercavam" naquele espaço. não resisti e pisquei-lhe o olho deixando-a assim mais à vontade e "segura". retribui-me da mesma forma corando. permanecemos naquela comunicação de sorrisos e expressões misteriosas sentidas. foi ali que me fez recuar no tempo. ocorreram as repentinas saudades dos tempos em que ficava horas sentada no sofá a ver filmes de VHS até já não haver posição pois tinha que decorar as falas e músicas por inteiro. cantava-as à minha mãe e a quem mais quisesse ouvir. de seguida surgia a alegria quando vestia aquelas saias rodadas para dançar a lambada como se não houvesse amanhã. era a avó que me as oferecia. decidia então que tinha que colorir mais um livro até a tinta da caneta acabar. claro que depois só restavam aquelas cores escuras de pouco uso.ai, como ficava triste quando isso acontecia. mas o telefone de casa era o meu " faz de conta" preferido. criava as minhas história, aquelas que me apetecia no momento. irreais. vividas tão intensamente ao ponto de parecerem as minhas verdadeiras histórias. ora umas vezes era uma "mãe chateada a falar com o professor do filho que tinha mau comportamento". outras vezes " a namorada que mandava raspanetes por telefone porque ele namorado parvo gritava com ela e não a ia visitar com mais frequência." ou então " ligar para as amigas a lamentar o facto de estarem doentes e não poderem sair ".
vida de criança é mágica. instantânea e veloz. (isso efetivamente não é só coisa de adultos).
é uma maravilha que encanta só de ver. uma vontade enorme de permanecer e ficar num atraso impedido e demorado.
hoje vou procurar um pijama carregado de figuras e contá-los até adormecer. se conseguir encontrar digo-vos quantos contei e como eram.
e só por um bocadinho.
poder ser criança e achar que tudo é festa.
adormecer a saber que não há começo nem fim.
que não sei o que é a dor.
que a beleza existe em tudo. tanto no bem como no mal.
Muito bom texto. Tenho saudades de ser criança. De tudo parecer mágico quando, afinal, sendo adulto descobre-se que é tudo um tédio.
ResponderEliminarhttp://invisibletooureyes.blogspot.pt/2011/10/saudades-desse-tempo-feliz-colorido.html :)
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